O lapso de tempo ao redor da incisão cirúrgica e do período de recuperação pós-operatória precoce, tem sido nomeado como período decisivo, pelo fato de que em teoria nesse momento um processo infeccioso consegue se estabelecer ou ser prevenido. É neste período que as defesas do paciente em combinação com os antibióticos profiláticos têm um papel fundamental na prevenção de Infecções do Sítio Operatório.
Coincidentemente o período decisivo é na realidade o “nosso tempo”, ou seja, o tempo do anestesiologista. Faz mais de uma década que a administração de antibióticos profiláticos perioperatórios é responsabilidade do anestesiologista. Rotineiramente o profissional executa esse passo segundo os protocolos estabelecidos, mas o quão razoável e acurada é essa administração? Estamos avaliando as características farmacocinéticas e farmacodinâmicas dos antibióticos de maneira inteligente?
Vejamos um exemplo: As cefalosporinas de primeira e segunda geração, – Cefazolina, Cefuroxima, e Cefoxitin – amplamente utilizadas como drogas de primeira linha em profilaxia cirúrgica, são bactericidas tempo dependentes com meia-vidas curtas, quase sem efeito pós-antibiótico, o que obriga a sua administração frequente em doses baixas para manter concentrações teciduais quatro vezes acima da Concentração Mínima Inibitória (MIC) durante todo o período decisivo. (veja gráfico abaixo)
Na prática isso significa que Cefazolina, por exemplo, com uma meia-vida entre 1,2 a 2,2 horas, estaria abaixo da MIC antes de culminar o período decisivo, mas a recomendação clássica de re-dosificação seria cada 3 a 4 horas. No caso do Cefoxitin a sua meia-vida é ainda mais curta, de apenas 1 hora. O que fazer nesses casos? Uma alternativa simples: a dose a ser administrada em bolus no próximo intervalo poderia ser administrada em infusão contínua imediatamente após a dose inicial, ou seja, 2g de Cefazolina para correr em 4 horas, ou 500 mg por hora. No caso do Cefoxitin ficaria em 2g por hora. Sob o mesmo princípio pode ser usado para Cefuroxima.
Essa aproximação baseada na farmacocinética e farmacodinâmica dos antibióticos é a mais racional e efetiva, pois garante concentrações constantes acima da MIC durante a incisão e a sutura da ferida operatória. É importante realçar que o mesmo princípio não é aplicável a antibióticos com efeito pós-antibiótico considerável, como quinolonas, metronidazol, e aminoglicosídeos; o exemplo aplica-se só para betalactâmicos.
Que saber mais sobre as doses e repiques dos Antibióticos Profiláticos durante o ato cirúrgico? Faça o download da tabela abaixo ↓↓
Saiba mais em:
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